O dia que não terminou

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Às dez e pouco do último domingo começaram os gritos e ruídos que anunciavam a entrada do Radiohead no palco da Chácara do Jóquei. A noite estava clara, a temperatura amena e a anunciada chuva não veio. Ao meu redor, todos estavam na ponta dos pés, de pescoços erguidos, como se assim ficassem mais próximos do palco. Os britânicos entraram em cena e começaram o show com 15 Step. Som perfeito, o público não se continha.


Por alguns instantes ouviu-se pouco a música que vinha do palco. Eu não sabia se me deixava levar pela canção ou se prestava atenção à apresentação - só depois de um tempo eu soube equilibrar as duas coisas. A primeira música indicou o que as 30 mil pessoas que lotavam o espaço poderiam esperar das próximas duas horas. Na sequência, vieram There there, do Hail to Thief e National Anthem, do Kid A, disco que deu início à fase mais experimental do grupo.


No palco, via-se um equilíbrio entre feeling e profissionalismo. Thom Yorke parece sentir profundamente cada palavra e acorde que toca. Johnny Greenwood cuida feito louco para que saia tudo bem com os apetrechos eletrônicos que acompanham a banda desde Kid A. Durante o show, os telões trouxeram imagens dos cinco músicos em enquadramentos inusitados.


Apesar de os trintões de Oxford não terem dito mais que uns poucos "obrigados" entre as músicas, a comunicação com o público não poderia ter sido melhor. O auge foi ao fim de Paranaiod Andriod, um dos hits da noite. A música terminou, mas a galera não parou de fazer o backing vocal. Com o violão em mãos, Yorke entrou no clima e, em coro com a platéia, continuou a primeira voz, estendendo o final da canção. Isso foi no primeiro bis. A banda ainda voltaria ao palco outras duas vezes.


Dramas contemporâneos


O set list da noite teve por base o último disco, In Rainbows, que foi disponibilizado para download pela própria banda. A apresentação deixou claro porquê o Radiohead é um dos nomes mais importantes do pop contemporâneo. Os ingleses estão antenados com o que se passa em seu tempo. Em todos os sentidos. Tanto no que diz respeito às tendências musicais quanto à compreensão dos dramas do século 21. As críticas acerca do show foram unânimes em dizer que a noite foi histórica.


As coisas, no entanto, ainda me são um pouco nebulosas, confusas. É como se o último domingo ainda não tivesse terminado. A distorção pesada antes do refrão de Creep, que encerrou o espetáculo, ainda paira na memória. Junto a ela, o monte de copos plásticos espalhados pelo local após a apresentação e o estacionamento surreal, que trazia à tona a realidade de São Paulo. O evento refletiu bem as contradições da vida contemporânea nas grandes cidades, regada a desigualdades, congestionamentos, gás carbônico e consciência ambiental. A noite não poderia ter sido mais Radiohead.





Resenha por: Diego Dacax

Entulho Cósmico

Toda a palavra é um verso e todo o verso é um infinito

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