ESTADO DO PARÁ, TERRA SEM LEI: NOTA DE MORTE ANUNCIADA

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A história se repete!

Novamente, choramos e revoltamo-nos:
Direitos Humanos e Justiça são para quem neste país?

No dia 24 de maio de 2011, foram assassinados nossos companheiros, José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, assentados no Projeto Agroextrativista Praialta-Piranheira, em Nova Ipixuna – PA. Os dois foram emboscados no meio da estrada por pistoleiros, executados com tiros na cabeça, tendo Zé Claúdio a orelha decepada e levada pelos seus assassinos provavelmente como prova do “serviço realizado”.
Camponeses e líderes dos assentados do Projeto Agroextratista, Zé Cláudio e Maria do Espírito Santo (estudante do Curso de Pedagogia do Campo UFPA/FETAGRI/PRONERA), foram o exemplo daquilo que defendiam como projeto coletivo de vida digna e integrada à biodiversidade presente na floresta. Integrantes do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), ONG fundada por Chico Mendes, os dois viviam e produziam de forma sustentável no lote de aproximadamente 20 hectares, onde 80% era de floresta preservada. Com a floresta se relacionavam e sobreviviam do extrativismo de óleos, castanhas e frutos de plantas nativas, como cupuaçu e açaí. No projeto de assentamento vive aproximadamente 500 famílias.
A denúncia das ameaças de morte de que eram alvo há anos alcançaram o Estado Brasileiro e a sociedade internacional. Elas apontavam seus algozes: madeireiros e carvoeiros, predadores da natureza na Amazônia. Nem por isso, houve proteção de suas vidas e da floresta, razão das lutas de José Cláudio e Maria contra a ação criminosa de exploradores capitalistas na reserva agroextrativista.
Tamanha nossa tristeza! Desmedida nossa revolta! A história se repete! Novamente camponeses que defendem a vida e a construção de uma sociedade mais humana e digna são assassinados covardemente a mando daqueles a quem só importa o lucro:

MADEREIROS e FAZENDEIROS QUE DEVASTAM A AMAZÔNIA.  
ATÉ QUANDO?


Não bastasse a ameaça ser um martírio a torturar aos poucos mentes e corações revolucionários, ainda temos de presenciar sua concretude brutal?
Não bastasse tanto sangue escorrendo pelas mãos de todos que não se incomodam com a situação que vivemos, ainda precisamos ouvir as autoridades tratando como se o aqui fosse distante?
Não bastasse que nossos homens e mulheres de fibra fossem vistos com restrição, ainda continuaremos abrindo nossas portas para que os corruptos sejam nossos lideres?
Não bastasse tanta dificuldade de fazer acontecer outro projeto de sociedade, ainda assim temos que conviver com a desconfiança de que ele não existe?


Não bastasse que a natureza fosse transformada em recurso, a vida tinha também que ser reduzida a um valor tão ínfimo?
Não bastasse a morte orbitar nosso cotidiano como uma banalidade, ainda temos que conviver com a barbárie?
Mediante a recorrente impunidade nos casos de assassinatos das lideranças camponesas e a não investigação e punição dos crimes praticados pelos grupos econômicos que devastam a Amazônia, RESPONSABILIZAMOS O ESTADO BRASILEIRO – Presidência da República, Ministério do Desenvolvimento Agrário, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Instituto Brasileiro de Meio Ambiente, Polícia Federal, Ministério Público Federal – E COBRAMOS JUSTIÇA!
ESTAMOS EM VÍGILIA!!!


“Aos nossos mortos nenhum minuto de silêncio. Mas toda uma vida de lutas.”


Marabá-PA, 24 de Maio de 2011.
Universidade Federal do Pará/ Coordenação do Campus de Marabá; Curso de Pedagogia do Campo UFPA/FETAGRI/PRONERA; Curso de Licenciatura Plena em Educação do Campo;
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST/ Pará;
Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura – FETAGRI/Sudeste do Pará;
Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura Familiar – FETRAF/ Pará;
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB;
Comissão Pastoral da Terra – CPT Marabá;
Via Campesina – Pará;
Fórum Regional de Educação do Campo do Sul e Sudeste do Pará.


NOTA PÚBLICA da Coordenação Nacional da CPT

“Se nos calarmos, as florestas gritarão”

A Coordenação Nacional da CPT, reunida em Goiânia para uma de suas reuniões ordinárias, recebeu com extrema tristeza e indignação a notícia do assassinato do casal Maria do Espirito Santo da Silva e José Cláudio Ribeiro da Silva, ocorrido na manhã do dia 24 de maio, no Projeto de Assentamento Extrativista, Praia Alta Piranheira, no município de Nova Ipixuna, sudeste do Pará.

Esta é mais uma das ações do agrobanditismo e mais uma das mortes anunciadas. O casal já vinha recebendo ameaças de morte. O nome deles constava da lista de ameaçados de morte registrada e divulgada pela CPT. O de José Cláudio em 2009 e em 2010, e o de sua esposa Maria do Espírito Santo, em 2010 (seguem em anexo as duas listas). Esta lista, junto com a dos assassinatos no campo de 1985 a 2010 foi entregue ao Ministro da Justiça, no ano passado. Mas nenhuma providência foi tomada.

“José Cláudio e Maria do Espírito Santo se dirigiam de moto para a sede do município, localizada a 45 km, ao passarem por uma ponte, em péssimas condições de trafegabilidade, foram alvejados com vários tiros de escopeta e revólver calibre 38, disparados por dois pistoleiros que se encontravam de tocaia dentro do mato na cabeceira da ponte. Os dois ambientalistas morreram no local. Os pistoleiros cortaram uma das orelhas de José Cláudio e a levaram como prova do crime”, registra nota CPT de Marabá, que esteve no local do crime.
José Cláudio e Maria do Espírito Santo foram pioneiros na criação da reserva extrativista do Assentamento Praia Alta Piranheira no ano de 1997. Devido à riqueza em madeira, a reserva era constantemente invadida por madeireiros e pressionada por fazendeiros que pretendiam expandir a criação de gado no local.

Mas nossa indignação aumentou com a notícia, veiculada pelo jornal Valor Econômico do dia de hoje, 25, de que o deputado José Sarney Filho ao ler, em plenário, a reportagem da morte dos dois lutadores do povo, foi vaiado por alguns deputados ruralistas e pessoas presentes nas galerias da Câmara Federal, que lá estavam para acompanhar a votação do novo Código Florestal.  Este fato nos dá a exata dimensão de como a violência contra os trabalhadores e trabalhadoras do campo é tratada. Certamente a notícia destas mortes foi recebida com alegria em muitos espaços, pois mais um “estorvo” no caminho dos ruralistas e dos defensores do agronegócio foi removido.

A Coordenação Nacional da CPT reafirma a responsabilidade do Estado por este crime. A vida das pessoas e os bens natureza nada valem se estes se interpuserem como obstáculo ao decantado “crescimento econômico”, defendido pelos sucessivos governos federais, pelos legisladores do Congresso Nacional que aprovam leis que promovem maior destruição do meio ambiente, e pelo judiciário sempre muito ágil em atender os reclamos da elite agrária, mas mais que lento para julgar os crimes contra os camponeses e camponesas e seus aliados. A certeza da impunidade alimenta a violência.

Parafraseando o Evangelho, não podemos nos calar diante desta barbárie, pois se nos calarmos, as florestas falarão (Lc 19,40).

Goiânia, 25 de maio de 2011.
A Coordenação Nacional da CPT

Maiores informações:
www.cptnacional.org.br


26/05/2011

Nova Ipixuna: polícia já tem pista dos culpados (Nota da CPT - Marabá)

A polícia do Pará já tem indícios dos autores do assassinato dos ambientalistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, ocorrido na manhã de terça-feira, em uma estrada vicinal que dá acesso ao assentamento agroextrativista Praialta-Piranheira, a 45 quilômetros de Nova Ipixuna, no sudeste do Estado. Alguns nomes de suspeitos foram checados, mas a polícia não revela detalhes para não prejudicar a investigação. Moradores da comunidade Maçaranduba 2, onde o casal residia, já foram ouvidos e forneceram pistas sobre possíveis mandantes do crime e os pistoleiros.

(jornal Diário do Pará)

O casal foi morto quando se dirigia de motocicleta à sede do município. Foram alvejados com vários tiros de escopeta e revólver calibre 38, disparados por dois pistoleiros que se encontravam de tocaia dentro do mato. Os pistoleiros cortaram uma das orelhas de José Cláudio e levaram como prova do crime.

“Eu defendo a floresta em pé e seus habitantes, mas devido esse meu trabalho sou ameaçado de morte pelos empresários da madeira, que querem derrubar tudo”, denunciava José Cláudio em um vídeo gravado durante um encontro de ambientalistas em Manaus (AM), no ano passado. Ele dizia na gravação que a qualquer momento poderia “aparecer morto”, porque vivia com uma “bala na cabeça”. José Cláudio foi o primeiro presidente da associação do assentamento e foi sucedido na presidência da entidade por sua mulher, Maria do Espírito Santo.

O casal, por diversas vezes, interditou estradas de acesso aos assentamentos, parando caminhões de madeireiros dentro da reserva. Depois de anotar as placas, encaminhavam as denúncias ao Ibama e ao Ministério Público Federal. Eles lideravam 300 famílias. No final do ano passado, a dupla escapou de uma emboscada. Pistoleiros foram até a residência do casal para matá-los, mas não os encontraram. A Comissão Pastoral da Terra (CPT) denunciou em seu caderno de conflitos agrários que José Ribeiro e Maria estavam em uma lista de 58 pessoas marcadas para morrer no Pará.

HEDIONDO

O secretário de Segurança Pública, Luiz Fernandes, disse ontem em Marabá que cerca de 50 policiais civis e militares estão na região do crime fazendo buscas pelos criminosos. A Polícia Federal também vai entrar na investigação. Fernandes tratou do assunto com o delegado Roberto Nunes Teixeira, da PF de Marabá. Por ordem do Ministério da Justiça, a PF fará uma apuração própria. Para Fernandes, isso não impede a cooperação. “O trabalho integrado agiliza o processo investigatório”.

O delegado José Humberto de Melo Junior, titular da Delegacia de Conflitos Agrários de Marabá, preside o inquérito e é a fonte oficial de informações sobre a investigação dos crimes, classificados de “hediondos” pelo governador Simão Jatene. Ele determinou uma “reação enérgica” ao que chama de “atitude irracional” dos responsáveis pelas mortes.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Regional Norte 2, condenou o crime, afirmando em nota que o episódio “escancara a deficiência do Estado Brasileiro em defender os filhos da terra que lutam em favor da vida”. A entidade lembra que em 2001 foi realizada, no município de Marabá, uma audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal. Durante essa audiência, José Cláudio informou abertamente que estava ameaçado de morte.

A CNBB diz que recebe muitas denúncias de pessoas ameaçadas de morte. Entre elas, estão missionários, bispos, padres, irmãs e leigos que atuam no Pará.
Hilário Lopes Costa, coordenador estadual da Comissão Pastoral da Terra (CPT), afirma que no ano passado a comissão fez 30 casos de denúncias sobre pessoas que estavam sendo ameaçadas de morte no Estado.

OUVIDOR NO PARÁ

O ouvidor agrário nacional, desembargador Gercino Filho, está no Pará desde ontem para acompanhar as investigações sobre o assassinato, por determinação do ministro do Desenvolvimento Agrário, Afonso Florence. Ele reúne hoje a Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo dentro do projeto Praialta-Piranheira. Até sexta-feira, Gersino Filho preside reuniões com a Polícia Federal, Ministério do Meio Ambiente, Ministério Público Federal, Ibama, Incra, Delegacia de Conflitos Agrários do Pará e produtores rurais do projeto. (Diário do Pará)

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