O ESPECTRO TEMPO

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Prendo o tempo nas mãos

e saio procurando a saída.

Nenhum gesto comporta o irreparável.

Todos os fragmentos das memórias anteriores ao futuro arrastam-se

como um trem cansado que geme a margem do precipício.

Já vejo o túnel...

Praparo-me para prender a respiração no fundo dos olhos, último lugar invulnerável...

Não ouço mais ruídos nem as cólicas de angustias me atraem,

Rendo-me ao esparso vácuo elementar.

Período curto,

Onde as surpresas revelam-se caixas vazias com laços eleatorios.



Nenhum destino trilhado passa por minhas asas.

Não há duvidas que fiz o tempo refém

mas as lágrimas nos ensoparam com delicadas palavras de socorro...

Mergulhamos na anti-materia da ausência,

peixes em forma de versos antigos, fazendo lembrar de anti- ânsias pelo concreto,

Cintilantes pedaços de sorrisos rimam com tristezas formando duetos

atrofiados cabelos dos versos...

No fundo somos

as caldas da melodias que flutua em orbitas lunares

onde descansamos em desespero.



Já não vejo o tempo.

O lençol delirante da borda do pesadelo,

tremula como uma bandeira dissonante

em acordos de boca com meu espírito inconsciente,

a dormência leve e gelada passeando pelos vulcões da tristeza

que resolvem jogar para fora a fúria que reside na tez das galáxias.

Aceito ser levado e miro alguma estrela

aceito o mar de cabeça para baixo

já que sou as chuvas escuras das tardes paradas.



Deus pergunta
-onde ele está?
Respondo...
-deitando nos seus calcanhares para não incomodar
com meu drama findo e obliquo
-eis aqui o poeta – esbraveja!
-Não sou mais eu nem ninguém.
Desde mim até a mais minusculamente partícula existente te procurava...

O tempo larga minha mão e segue...

o temporal cinza das vagas horas petrificadas toca como se sino fosse

Meu coração, fabricado num crepúsculo irradiante

e incerto levanta-se...

Para voltar a ser a pulsação renascida de si mesmo.



11-01-10

João Leno Lima


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Bem vindo ao mundo 2010 de Orwell

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17:38

 

 por John Pilger

Cartoon de Latuff.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Em 1984, George Orwell descreveu um super-estado chamado Oceânia, cuja linguagem de

guerra invertia mentiras que "passaram à história e tornaram-se verdades. 'Quem controla o passado', apregoava o slogan do partido, 'controla o futuro: quem controla o presente controla o passado'."
Barack Obama é o líder de uma Oceânia contemporânea. Em dois discursos no encerrar da década, o ganhador do Prémio Nobel da Paz afirmou que a paz não era mais paz, mas ao invés disso uma guerra permanente que "se estende bem para além do Afeganistão e do Paquistão", para "regiões desordenadas e inimigos difusos". Ele chamou a isto "segurança global" e pediu a nossa gratidão. Para o povo do Afeganistão, que a América invadiu e ocupou, ele disse astuciosamente: "Não temos interesse em ocupar o vosso país".


Na Oceânia, verdade e mentira são inseparáveis. Segundo Obama, o ataque americano ao Afeganistão em 2001 foi autorizado pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas. Não houve autoridade da ONU. Ele disse que "o mundo" apoiou a invasão no rastro do 11/Set quando, na verdade, todos menos três dos 37 países inquiridos pela Gallup exprimiram uma oposição esmagadora. Ele disse que a América invadiu o Afeganistão "só depois de os Taliban se recusarem a entrega [Osama] bin Laden". Em 2001, o Taliban tentou três vezes encaminhar bin Laden para julgamento, informou o regime militar do Paquistão, e foram ignorados. Mesmo a mistificação de Obama do 11/Set como justificação para a sua guerra é falsa. Mais de dois meses antes de as Torres Gémeas terem sido atacadas, o ministro paquistanês dos Negócios Estrangeiros, Niaz Naik, foi informado pela administração Bush de que um assalto militar americano ocorreria em meados de Outubro. O regime Taliban em Cabul, o qual a administração Clinton secretamente apoiara, já não era encarado como suficientemente "estável" para assegurar o controle da América sobre os pipelines do Mar Cáspio de petróleo e gás. Tinha de acontecer.


A mentira mais audaciosa de Obama é que o Afeganistão de hoje é um "abrigo seguro" ("safe haven") para todos os ataques da al-Qaeda ao Ocidente. O seu próprio conselheiro de segurança nacional, general James Jones, disse em Outubro que havia "menos de 100" membros da al-Qaeda no Afeganistão. Segundo a inteligência dos EUA, 90 por cento dos Taliban dificilmente são Taliban mas sim "uma insurgência tribal localizada [a qual] considera-se como opositora dos EUA porque é uma potência ocupante". A guerra é uma fraude. Só os idiotas rematados continuam a acreditar na espécie de "paz mundial" de Obama.


Abaixo da superfície, contudo, há um objectivo sério. Sob o inquietante general Stanley McCrystal, o qual distinguiu-se pelos seus esquadrões de assassinato no Iraque, a ocupação de um dos países mais empobrecidos é um modelo para aquelas "regiões desordenadas" do mundo ainda além do alcance da Oceania. Isto é conhecido como COIN, ou rede de contra-insurgência (counter-insurgency network), a qual mobiliza em conjunto militares, organizações de ajuda, psicólogos, antropólogos, os media e assalariados de relações públicas. A coberto do jargão acerca de ganhar corações e mentes, o seu objectivo é contrapor um grupo étnico contra outro e incitar a guerra civil: tajiques e uzbeques contra pashtuns.


Os americanos fizeram isto no Iraque e destruíram uma sociedade multi-étnica. Eles corromperam e construíram muralhas entre comunidades que outrora casavam-se entre si, fizeram limpeza étnica dos sunitas e expulsaram milhões para fora do país. Os media incorporados [às tropas] relataram isto como "paz" e académicos americanos comprados por Washington e por "peritos em segurança" instruídos pelo Pentágono apareceram na BBC para difundir as boas notícias. Tal como no 1984, a verdade era o oposto.

 
Algo semelhante está planeado para o Afeganistão. O povo está a ser forçado a ir para "áreas alvo" controladas por senhores da guerra financiados pelos americanos e pelo comércio de ópio. Que estes senhores da guerra sejam infames pela sua barbárie é irrelevante. "Podemos viver com isso", disse um diplomata da era Clinton acerca da perseguição às mulheres num Afeganistão "estável" dirigido pelo Taliban. Agências de ajuda favorecidas pelo ocidente, engenheiros e especialistas em agricultura tratarão da "crise humanitária" e assim "proteger" as terras tribais subjugadas.
Esta é a teoria. Ela funcionou de certo modo na Jugoslávia onde a partição com base no sectarismo étnico liquidou uma sociedade outrora pacífica, mas fracassou no Vietname onde o "programa de aldeias estratégicas" da CIA foi concebido para encurralar e dividir a população do Sul e assim derrotar o Viet Cong – a expressão genérica dos americanos para a resistência, semelhante a "Taliban".


Por trás de grande parte disto estão os israelenses, os quais há muito aconselham os americanos tanto nas aventuras do Iraque como do Afeganistão. Limpeza étnica, construção de muralhas, postos de controle (checkpoints), punição colectiva e vigilância constante – são inovações israelenses que tiveram êxito em roubar a maior parte da Palestina do seu povo nativo. E apesar de todo o seu sofrimento, os palestinos não foram divididos irreversivelmente e aguentam-se como nação contra todas as adversidades.


Os mais notáveis antecessores do Plano Obama, os quais o vencedor do Prémio Nobel da Paz, o seu estranho general e os seus homens de RP preferem esquecer, são aqueles que fracassaram no próprio Afeganistão. Os britânicos no século XIX e os soviéticos no século XX [1] tentaram conquistar aquele país selvagem pela limpeza étnica e foram despedidos, embora apesar de terríveis banhos de sangue. Os cemitérios imperiais são os seus monumentos comemorativos. O poder do povo, por vezes desconcertante, muitas vezes heróico, permanece em semente sob a neve e os invasores temem-no.


"Era curioso", escreveu Orwell em 1984, "pensar que o céu era o mesmo para todos, na Eurásia ou na Ásia do Leste assim como aqui. E as pessoas sob o céu também era muito parecidas, por toda a parte, por todo o mundo ... pessoas ignorando a existência umas das outras, mantidas à parte por muralhas de ódio e mentiras, e ainda assim quase exactamente as mesmas pessoas que ... estavam a armazenar nos seus corações, barrigas e músculos o poder que um dia transformaria o mundo".

 

31/Dezembro/2009

 

 

Texto Original

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