Por | João L
Muito já se falou sobre um dos maiores artistas mexicanos, o ator Roberto Gómez Bolaños, criador de personagens que embalaram a infância de muitas gerações, onde a simplicidade dos gestos, que lembra muito o de artistas como Charles Chaplin, encantou muitos ao ponto de causar grande comoção em vários países. Mas, a verdadeira relevância do artista está para além das piadas, está no olhar que ele deu para um dos países mais problemático da américa, o México.
Sofrendo com gravíssimas crises sociais, que inclui uma alarmante desigualdade e uma crescente violência, que consegue em alguns casos, superar a do Brasil, um país absurdamente violento. Em 1994 o país entrou para o NAFTA (Área de Livre Comércio da América do Norte) o que a princípio poderia parecer bom para o povo se mostrou pouco tempo depois um tiro no pé. Como o maior país de língua espanhola iria concorrer com Estados Unidos e Canadá, outros dois poderosos membros do grupo? a Revolta de Chiapas foi um dos pontos importantes nesses conflitos de interesses que isto se tornou. Mas nos últimos anos, tudo tem se agravado. Grandes cartéis de drogas tornaram as fronteiras mexicanas locais nebulosos. Com armas compradas ou não, nos grandes vizinhos. Outro fator grande é o desemprego e o baixo crescimento econômico.
Quando apresentou na década de 70 seu personagem, talvez Bolaños não acreditasse que chegaria tão longe, por tantos anos à tantos países. Retratando a simplicidade de uma vila, as frágeis relações humanas, os problemas financeiros e a pequena realidade desigual do povo, ela acabou conquistando muitos fãs. Talvez por encontrar no personagem, uma espelho de uma terrível realidade vivida pelo cidadão. Mas, Chespirito não tinha a intenção de ser nenhum revolucionário, Roberto Gómez nunca foi um grande ativista das causas mexicanas, sempre permaneceu em sua real dimensão, um artista. Como os artistas mexicanos, como o grande escritor Octavio Paz ou Frida Kahlo por exemplo.
E é neste contexto que o papel do artista se releva necessário e onde fica sua verdadeira significância. Claro, nada impede que um artista saia às ruas e proteste contra o governo e as mazelas sociais mas ele não deixará de ser menos artista se o não fizer. Para Nietzsche a arte existe para que a realidade não nos destrua, seu papel não é de exatamente mudar o mundo, impedir as tragédias entre os homens – sabe-se que Hitler tinha a obra completa de Shakespeare em sua biblioteca pessoal – Como disse o poeta Roberto Piva: Baudelaire, o Artaud, o Gottfried Benn e o Georg Trakl não impediram Auschwitz. Mas poderiam?
A comoção e a tristeza em torno da morte de Roberto Gómez é válida e sincera em muitos casos. Claro, prato cheio para que a mídia sensacionalista ou a “sociedade do espetáculo” surfar e muitos vão nessa onda, fala-se até na divisão da herança e dos direitos sobre os personagens criados por ele. Aqui no Brasil nos habituamos a encontrar o “Chaves” todas as tardes na emissora do Sílvio Santos, lá é um dos programas de maior audiência de uma TV que tem seu público fiel apesar de ter uma programação por vezes, sofrível. Uma parte da nossa geração cresceu rindo das piadas e tiradas atemporais do garoto que mora num barril, que é absurdamente sua casa, muitos aqui no Brasil só têm um papelão para se cobrir do frio, é a arte imitando a vida.
Roberto Gómez Bolaños se foi, a arte criada com Chespirito ainda deve embalar e fazer rir muitas gerações. Seu papel foi de encantar, fazer sonhar, contar uma dramática realidade de um problemático país com bom humor e sensibilidade, mas não o impediu este lugar de ser tão desigual, tão cheio de contrastes. Ter assistido suas belas criações como ator não evitou que toda uma geração se perdesse. Definitivamente, o artista não veio para impedir uma guerra mas a arte de traduzir a realidade, seja ela qual for, é um dos seus mais nobres papeis.
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